Saturday, January 14, 2012

Reduzindo a influência do FGFR3 na acondroplasia, parte 1


Como já vimos (artigos anteriores), as principais alterações que prejudicam o crescimento ósseo na acondroplasia são causadas ​​pelo excesso de atividade do receptor do fator de crescimento de fibroblasto do tipo 3 (FGFR3) devido a uma mutação (troca) simples nessa proteína.

Como podemos gerenciar este receptor workaholic? Como podemos reduzir ou abolir atividade do FGFR3 ou contrabalançar os seus efeitos nos condrócitos, as células que, em última instância, são responsáveis pela criação da base onde os ossos são construídos? Se eles não se multiplicam (proliferação) e crescem (hipertrofia), haverá menos base para o osso a crescer.


Vimos como o FGFR3 funciona, como ele é produzido e como ele é conduzido para a desativação. Vamos começar agora a ver as muitas possibilidades para lidar com ele, começando por examinar diretamente como bloquear ou inibir a atividade do FGFR3.


Quando alguém pensa sobre o tratamento da acondroplasia o primeiro pensamento natural é: “temos que acabar com este receptor. Ele tem de parar de exercer suas ações.”


Mirando o FGFR3 de fora da célula


Estes foram muito provavelmente os primeiros pensamentos dos pesquisadores desde que o defeito básico da acondroplasia foi identificado. No entanto, desde o início, a tarefa também se mostrou bastante complexa. Você deve se lembrar que mencionamos que a placa de crescimento é um ambiente muito bem protegido. Não há vasos sanguíneos em seu interior, logo não há fluxo de sangue direto para levar oxigênio e nutrientes aos condrócitos. O meio ambiente local, ao qual chamamos matriz da cartilagem, é um terreno denso e tudo que é direcionado aos condrócitos deve passar por este território. Um estudo publicado em 2006 por Farnum et al. mostrou que moléculas de baixo peso molecular podem trafegar na placa de crescimento e que as moléculas maiores do que 40kDa provavelmente sofrem maior resistência para difundir neste ambiente (kDa significa kilodalton, onde dalton é uma unidade de medida de peso molecular).


Anticorpos


Aprender sobre o tráfego de placa de crescimento pode ajudar a explicar muita coisa sobre as primeiras interessantes  experiências  feitas com anticorpos específicos contra o FGFR3. Proteínas têm a propriedade de provocar reações do sistema imunológico. Quando uma proteína não-self (uma proteína que não pertence ao corpo) é exposta ao sistema imunológico, a defesa do corpo geralmente produz anticorpos específicos para ligar e bloquear o “'invasor”. Esta propriedade das proteínas é largamente utilizada na criação de anticorpos terapêuticos para o tratamento de muitas doenças. Também devemos ter em mente que os anticorpos são como as proteínas, eles também podem provocar respostas imunes contra eles.


Por exemplo, anticorpos contra enzimas receptoras como o FGFR3 estão sendo usados ​​para tratar alguns tipos de câncer. Um bom exemplo é o trastuzumabe, um anticorpo que foi desenhado para bloquear a atividade de uma enzima receptora chamada de receptor do fator de crescimento epidérmico (ou EGFR) para tratar o câncer de mama. O EGFR é, como o FGFR3, posicionado através da membrana celular, com uma porção extracelular (ou domínio) em contato com o meio ambiente. O anticorpo deixa a circulação e se liga ao receptor, bloqueando seu local de encaixe à molécula ativadora (EGF). Assim, um anticorpo trabalha fora da célula. A principal diferença aqui é que o tecido mamário é bem coberto por uma rede de vasos sanguíneos. A cartilagem não é. Você pode ver a forma como funciona o trastuzumabe assistindo a esta curta animação (sem áudio).

Em 2003, um grupo israelense publicou os resultados de testes feitos com um anticorpo específico contra o FGFR3, chamado PRO-001 (Aviezer et al.). Os testes foram realizados em ossos de ratos e os resultados foram promissores. No entanto, desde então, não houve novas publicações e a razão (não temos certeza) poderia ser que um anticorpo convencional normalmente pesa 150 kDa ou mais, por isso não pode trafegar livremente através da matriz da cartilagem, sendo provavelmente eliminado do sangue antes de pode atingir seu alvo em uma concentração terapêutica. É provavelmente o tamanho das moléculas dos anticorpos que impede o seu uso terapêutico na acondroplasia  Você pode encontrar mais informações técnicas sobre o uso de anticorpos para bloquear o FGFR3 lendo o editorial do Dr Joseph Schlessinger, onde ele comenta as conclusões de um estudo com outro anticorpo anti-FGFR3 chamado R3Mab aqui

Então, aqui vai uma primeira recomendação a quem pesquisa uma abordagem terapêutica para a acondroplasia: a molécula deve ser pequena, provavelmente com peso inferior a 50kDa.


Mantendo a visão de fora da célula, existe alguma outra forma pela qual poderíamos bloquear o encaixe de ativadores (ou ligantes, os FGFs) do FGFR3 para que o receptor seja mantido desligado?  A resposta é sim.


Durante as últimas décadas, pesquisadores têm aprendido muito sobre a interação das proteínas com os ácidos nucléicos (DNA, RNA), que vamos chamar de nucleotídeos a partir de agora. Existem várias proteínas capazes de se ligar diretamente ao DNA (por exemplo, as proteínas “alfaiates” que eu mencionei em um artigo anterior) e RNA. Bem, por que não fazer o inverso, através da síntese de moléculas de nucleotídeos que podem se ligar diretamente a proteínas? Isso já foi feito, e as moléculas feitas de nucleotídeos (citamos como oligonucleotídeos) com essa finalidade são chamadas de aptâmeros.


Aptâmeros


Aptâmeros são muito específicos para os seus alvoss em um grau semelhante aos anticorpos convencionais. Além da especificidade semelhante, aptâmeros têm uma série de vantagens em relação aos anticorpos. Primeiro, eles são muito menos imunogênicos do que os anticorpos (o que significa que eles não causam o mesmo nível de reações de defesa imunológica que os anticorpos terapêuticos). A segunda característica importante e positiva é que aptâmeros costumam pesar de 15 a 45kDa.


Há pelo menos um aptâmero terapêutico já no mercado (pegaptanib), projetado para tratar uma condição oftalmológica, e há outros em ensaios clínicos para várias indicações. Até o momento, não há nenhuma pesquisa publicada de aptâmeros contra FGFR3. Uma consulta simples no Pubmed não identificou qualquer trabalho (palavrras-chave: aptamer, FGFR3, 29 de dezembro de 2011).  Aptâmeros representam uma tecnologia nova e há muitas perguntas a serem respondidas em relação à sua utilidade no tratamento de muitas doenças. Por exemplo, a cartilagem não é o tecido preferencial para depósito de aptâmeros. Não sabemos se um aptâmero específico contra o FGFR3 atingiria o alvo. Há apenas uma maneira de saber, que é testar a hipótese.


Você pode ler mais sobre aptâmeros aqui. Para mais informações técnicas, há essa boa revisão.

Concluindo, aptâmeros são uma abordagem em potencial a ser explorada para acondroplasia por várias razões:

• Trabalham fora da célula
• São pequenos
• São muito específicos
• Não são imunogênicos
• Têm um bom perfil de segurança

Em resumo, analisamos alguns dos desafios para o tratamento de acondroplasia. O primeiro é fazer a droga chegar ao alvo. Também discutimos brevemente duas opções para bloquear o FGFR3 de fora da célula. Uma já está disponível, que são os anticorpos específicos contra o receptor. O segundo é um potencial ainda a ser explorado, os aptâmeros.
No próximo artigo, vamos continuar a nossa análise sobre as terapias em potencial para acondroplasia visando o bloqueio direto ou a inibição do FGFR3, desta vez à procura de abordagens de dentro da célula.

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